terça-feira, 30 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

XII

Após a crise. Sopro Modernizador (1869-1879)

Passada a crise, em finais da década de 1860, a polémica sobre os destinos do império estabelece-se e nos anos subsequentes são cada vez menos as vozes daqueles que viam no ultramar um campo privilegiado de afirmação da nação portuguesa.
Em 1869, chegam notícias da descoberta de «importantíssimos jazigos auríferos e de pedra preciosa na África austral». O jornal do Comércio de 1-4,9-4 e 13-10-1869, noticiou a «extensíssima, tão rica e fertilíssima província de Moçambique», de novo transformada em Eldorado. Assim, nos começos de setenta há um breve período de euforia colonial por informações vindas de Angola, testemunhando o desenvolvimento comercial da colónia (iniciava-se, então, o ciclo da borracha); como também de Moçambique, embora em menor escala, que beneficiava da crescente relação com o Natal e da abertura do canal Suez em 1869.
Reformas
É neste contexto que a política de reformas e desenvolvimento do sistema colonial é conduzida, na década de 1870, por Andrade Corvo, na dupla qualidade de ministro dos Negócios Estrangeiros e de ministro da Marinha. A conjuntura, embora breve, favorecida pela prosperidade de alguns territórios ultramarinos, sobretudo Angola, terá facilitado a acção do ministro e novamente o nascimento do impulso imperial. Agora por preocupações de ordem mais genéricas. Andrade Corvo, ainda antes de assumir responsabilidades governativas, suscitava a reflexão sobre a questão nacional na sua Obra opúsculos «Perigos», escrito em 1870, quando decorria o «conflito franco-prussiano» e na península hispânica se agitava o fantasma da união ibérica. Os tratados de Viena de 1815, textos invocados por Andrade Corvo, em que analisava os princípios do novo direito internacional: O «Principio das nacionalidades», completado pelo da «soberania popular», o «sistema do equilíbrio europeu»; e a «teoria das raças». Esta teoria opõe uma recusa frontal, vendo na «sua monstruosidade aplicação à divisão dos impérios (…) um ataque a todos os princípios morais da organização das sociedades, conduzindo fatalmente à guerra, não sendo possível construir impérios. Quanto ao «sistema de equilíbrio europeu», para além de forçosamente instável, servia ultimamente de pretexto às grandes potências para reclamarem compensações territoriais (sempre às custas dos pequenos Estados, que para tal davam a «matéria-prima», não sendo nunca ouvidos sobre tão «cruéis e brutais atentados». Por último, o «princípio das nacionalidades» a que Andrade Corvo dava claramente preferência, desde que expurgado das manipulações que dele se vinham fazendo, cobrindo as anexações com o «aparente assentimento dos povos». Para que se lhe pudesse conferir um «valor real», para que não fosse um mero pretexto para refazer a carta da Europa segundo os desejos e as ambições dos grandes Estados», tornava-se indispensável tomar por base uma concepção precisa de nação, como «reunião de homens agrupados sobre um certo território, constituindo pelo assentimento geral, no que respeita à manifestação e defesa dos interesses comuns (…). Era uma perspectiva de nação de raiz contratual, assente na vontade livremente expressa dos povos. A única ressalva estava na exigência da «unidade de poder político, representando e dirigindo os comuns interesses perante os estrangeiros», como condição da existência da nação. O sentido era de conservar tanto quanto possível o traçada das fronteiras na Europa, evitando tanto os processos de fragmentação como os da unificação de Estados. A salvaguarda das pequenas potências estaria precisamente na estabilidade do sistema internacional, assente em «princípios claros, fundados na liberdade e independência das nações», bem como na sua cooperação. Como contraponto aos «grandes impérios» Corvo contava com as «grandes alianças» dos mais fracos, nas quais via o «meio profícuo de limitar e restringir a perigosa tendência que se manifestava na Europa, para a concentração das raças.
Fotos:
1-D.Luís I, rei de Portugal ( 18691-1869) à época
2- Andrade Corvo (ministro dos Negócios Estrangeiros e da Marinha)
Texto de Apoio: História da Expansão Portuguesa, Vol.4 (Direcção Francisco Bethencourt e Kirti Chauhuri/Círculo de Leitores), autor Valentim Alexandre.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

XI

Crise política
A crise política de 1858-1860 e as suas inflexões marcaram o debate sobre a questão colonial na Metrópole. Do ponto de vista institucional, as dificuldades encontradas para a organização de uma expedição militar destinada a Angola, em 1860, fazem emergir o problema da relação portuguesa entre o exército e o império.
Em Lisboa corria a notícia alarmante sobre a perda da colónia angolana e não se conseguia constituir uma força para ir em seu socorro por falta de oficiais que voluntariamente se dispusessem comandá-la. Só mediante vantagens concedidas pelas Cortes permitiu o envio de expedicionários de um curto Batalhão. Entretanto, instalara-se a polémica sobre a função e as obrigações do exército do reino, acusado por vários sectores de regatear o «preço dos seus serviços» (Jornal do Comércio, editorial de 06-05-1860) ou mesmo de ser movido «pelo amor do ouro», rebaixando “os brios militares à baixa e ignóbil bitola dos interesses sórdidos (A Nação, jornal legitimista, 08-05-1860).
As forças terrestres portuguesas estavam divididas em três exércitos distintos: o da Metrópole, o da Índia (luso-descendentes, formado pela escola local) e o restante Ultramar.
Em África, a grande maioria dos oficiais era de origem europeia, parte deles pertencentes ao quadro do Ultramar (o que impedia de regressar ao Reino antes de atingirem o posto de coronel, caso raro); outros iam em comissão de serviço, gozando de maiores vantagens. Esta divisão provocava graves atritos: existia pois uma separação quase absoluta entre os três exércitos. Era este o sistema colonial herdado do antigo regime colonial quando as colónias de África e o Oriente eram zonas periféricas, dotadas de grande autonomia e de certo modo desligadas do reino. Neste contexto, surge a exigência da fusão dos três exércitos num único corpo, responsável pela defesa do império. Mas as resistências, parte de raiz corporativa, eram tamanhas. Os militares do reino temiam que a concorrência no mesmo quadro de «oficiais do outro mundo», viessem subverter a ordem de antiguidade e preencher vagas com que contavam. Alegava-se que havia uma diferença essencial entre o serviço militar no reino, em defesa da pátria, e aquele que eventualmente se poderia ser chamado a cumprir no Ultramar. Era a recusa frontal do ponto de vista integracionista cara a Sá da Bandeira. O destino da expedição a Angola, em 1860, dizimada em alguns meses pela doença, contribuiu ainda mais para tais resistências.
No plano ideológico, o desfecho da questão da barca Charles et George – repressão do comércio negreiro -, veio contribuir para a crise de 1858-1860, ao realçar a polémica da política abolicionista de Sá Bandeira, dando novo fôlego as teses escravistas. A falta de apoio britânico (inabitual) ao Estado Português que até cumprira os seus compromissos internacionais, abria porta a contestação do tratado britânico de 1842, havendo várias vozes reclamando a sua anulação. Toda a questão da mão-de-obra adquirira nova actualidade a partir de inícios de 1865, face a apresentação de um projecto lei por Sá da Bandeira e António José de Ávila para a abolição imediata da escravatura nas colónias.
Reaparecem então os velhos estereótipos sobre a «indolência» e os «vícios» próprios da raça negra, em defesa das formas coercivas de trabalho. Surge depois um elemento novo, fazendo a apologia da compra ou «resgate» de escravos no interior de África, inculcando na linha da ideologia escravista tradicional, um verdadeiro acto humanitário, por alegadamente livrar da morte os criminosos e prisioneiros de guerra em poder dos sobas e também como o único processo de levar a religião e a civilização ao «sertão africano».
No plano político, um debate mais geral (década de 1860-1869) ganha corpo sobre a própria viabilidade do império. Debate que passa pela crescente inquietação sobre o futuro colonial do país, perante as dificuldades de rentabilizar os territórios do ultramar e os problemas diplomáticos daí advindos. Algum cepticismo é manifesto em artigos de fundo, v.g. no jornal do Comércio de Fevereiro de 1861, cuja raiz de índole humanista serve de base à recusa da era imperial, tida como inelutavelmente ligada à escravidão e ao terror. «Satisfazem as colónias de África ao generoso e cristianíssimo desígnio de civilizarem a raça vencida? - Ora digamos que nada temos feito neste sentido. A raça Africana está hoje na sua grande massa tão bárbara e tão moralmente negra como antes que nós ali plantássemos, se porventura o plantamos – o estandarte da Cruz». A situação vivida em África traça um quadro tal que contrasta com as imagens dominantes, como a seguir se transcreve: «As colónias de África são alguns brancos, que ali vivem alguns anos como que acidentalmente e sem lançarem raízes no solo, sem fundarem pela família a sociedade colonial. Em volta desta sociedade artificial e colectícia, desta cidade que todos os dias precisa de renovar-se com emigrantes da Europa, em volta desta povoação branca, cujo crescimento é problemático, acumulam-se sem outros laços mais que os da obediência, ditada pela escravidão, ou pelo terror, alguns centenares de mil indígenas, mal-avindos com a civilização cristã, que apenas conhecem pelas suas faces menos simpáticas. Uma antipatia de raça, fomentada pelos erros do sistema colonial, separa perpetuamente os dois elementos da colónia. Não há religião, não há moral, não há a educação da dignidade e do dever, não há para o negro o afecto egoísta por uma civilização, que só lhe deixa conhecer a superioridade, para ele odiosa, dos seus dominadores. O preto vive e morre selvagem dentro da cidade. O preto trabalha como um animal, pela abdicação da sua vontade, e não pelo exercício inteligente da sua liberdade pessoal»
É negada, igualmente, a utilidade das colónias para a metrópole, em termos económicos ou como destino para a sua população excedentária, concluindo o editorialista do jornal do Comércio: «As colónias não são pois para nós a cidade dilatada, para receber o supérfluo da nossa povoação. Não são também um instrumento de propaganda civilizadora. Ainda são menos uma empresa mercantil (…). Mas as colónias hão-de ser a nossa prosperidade! dizem alguns cidadãos iludidos por um benemérito amor da pátria. Não acabamos de cair nos meios com que esta profecia se há-de realizar».
A maioria inverte estes textos de cariz humanista, acima citados, lamentando-se a falta de opressão sobre o negro e as peias impeditivas sobre o trabalho forçado, assim: Que pode pois obter Portugal com a sua deplorável situação financeira, e com essa contrariedades que lhe impõe a natureza, a emancipação da espécie humana, e a voz altissonante das ideias humanitárias? – Perguntava um oficial em 1861, reflectindo uma preocupação bastante partilhada à época.
A recusa pela opção colonial não vai ao ponto de abandono pelas colónias mas antes por uma reorganização e venda de parte dos territórios ultramarinos. O principal defensor desta teoria é António José Seixas. Para ele deveriam afastar-se todas as considerações habituais sobre o valor dos territórios do ultramar como testemunhos das glórias do passado, todos os discursos plenos de «palavras elevadas e dos mais nobres exemplos da nossa bela história»
O futuro império teria de discutir-se apenas com «argumentos positivos»: os respeitantes ao desenvolvimento económico. Este era o campo cuja realidade era a da situação deplorável das colónias que jaziam «num estado que afrontava dignidade nacional».
Esta segunda concepção, que era pelo abandono do império e a sua reorganização pela venda de parte dos territórios do ultramar retirando dela vantagens económicas ( por exemplo, a venda das colónias além cabo, Goa e mais tarde Guiné como defendida António José Seixas em 1861), é relançada por carta de Seixas ao ministro do Ultramar em Novembro de 1866, ganhando maior acuidade em 1868 com a recepção das notícias da derrota da segunda expedição enviada a Moçambique a combater o «rebelde» Bonga (António Vicente da Cruz), senhor do prazo de Massangano, na realidade um micro - Estado independente.
A corrente favorável a recomposição do império não chegou a impor-se no plano político, não existindo qualquer hipótese de venda da parte do império que fosse nesta época ameaçada.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

X

Queda do governo Sá da Bandeira
Em Março de 1859 caía o Governo que Sá da Bandeira fazia parte. Fragilizado, entre várias questões, pela barca Charles et George. O novo ministro do Ultramar, Ferreri, demite e substitui Sá da Bandeira na presidência do Conselho Ultramarino.
Em 1860 o partido «histórico» regressa ao poder mas as «utopias» estavam fora de prazo.
Das novas orientações e mudanças políticas, destaca-se a mais sensível: o da mão-de-obra negra e o seu estatuto, com uma referência especial aos «carregadores» de Angola. Em 9 de Novembro de 1861, é feita consulta ao Conselho Ultramarino, na qual se fazia crítica expressa do decreto 1856 (que proibia o serviço forçado) por este servir de «estorvo à civilização, e ao progressivo melhoramento da África Portuguesa». O texto do actual Conselho tomava como boa toda a argumentação em defesa do trabalho forçado, vendo nele o único meio de vencer «as influências do clima, e os hábitos tradicionais de ociosidade» comuns naquelas «terras inóspitas», de forma a «trazer os seus habitantes às condições gerais do género humano». A consulta recomendava que fossem dadas novas instruções sobre a matéria e remetidas ao governador de Angola, instando igualmente a que se libertasse de todas as peias o transporte de escravos ou libertos para São Tomé e Príncipe, até então restringido pela «errónea inteligência» que em Portugal se vinha dando ao tratado luso-britânico de 1842 para a abolição do comércio negreiro. Nenhumas destas recomendações foi expressamente aceite pelo governo de Lisboa mas a política em Angola deu-lhe ampla satisfação.
Outros projectos da política de Sá da Bandeira foram igualmente abandonados, como a perspectiva expansionista em relação ao território angolano. Estão neste caso os dissabores surgidos com as ocupações de Ambriz e do Bembe e, em menor medida os planaltos do Sul de Angola. Em 1860, segundo instruções do governador Carlos Franco, foi determinado que se suspendessem todas as iniciativas anexionistas por falta de meios para as sustentar. Em Angola vai-se mais longe, propondo-se o abandono de posições recentemente ocupadas no interior e a concentração de esforços no litoral, culminando com a retirada, em 1873, da zona dos Dembos.

terça-feira, 23 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

IX

Integração política
A par da integração política, condicionada a prazo, Sá da Bandeira dava ainda grande importância à inserção da população «indígena» na economia de mercado, a obter por meios «suaves e indirectos», designadamente através do imposto, que, obrigando a procurar moeda, faria crescer tanto a oferta voluntária de trabalho como a produção de géneros agrícolas com destino ao mercado. Enquanto os meios coercivos, além de inconstitucionais, seriam também antieconómicos, dando origem a um trabalho de menor rentabilidade e provocando a fuga em massa da população.
Em meados de oitocentos, Sá da Bandeira não estava inteiramente só na perspectiva atrás referida, de cariz marcadamente etnocêntrica mas não racista. Os apoios eram no entanto minoritários. No Parlamento, as propostas antiesclavagistas encontravam sempre fortes resistências e os apoios eram por isso minoritários. O tom dominante era contrário à linha integracionista do ministro. As «correspondências» provenientes das colónias, particularmente de Angola, pintavam um quadro negro a respeito da situação criada pelas reformas impostas do governo de Lisboa, sobretudo do decreto que determinava a abolição do serviço forçado de «carregadores» - acusado de paralisar o transporte de produtos do sertão para Luanda e, o que era pior, de ter fomentado na população negra o espírito de desobediência e de insubordinação. Como se escrevia no Jornal do Comércio de 31 de Março de 1858 «Os pretos carregadores, libertos pelo decreto de 3 de Novembro de 1856, além de se prestarem às cargas com grande dificuldade, e por grande pagamento, têm dado em ladrões das mercadorias que lhes são entregues pelos feirantes do sertão!». E acrescentava-se: «mas o que espanta e desespera aos homens de bom senso, é ver como o Sr. Sá da Bandeira trabalha incessantemente a favor dos pretos desta colónia, deixando os brancos seus habitantes e o comércio, abandonados (…). Em Portugal, e nesta colónia, os súbditos do rei de Portugal, estão sujeitos a serem soldados, marinheiros, jurados, cabos de polícia, etc; porém o «cidadão preto», nascido vassalo de Portugal, e criado nas florestas que conquistaram os nossos avós, é declarado livre para continuar na sua barbaria e para roubar os brancos impunemente, que lhe entregam os seus haveres».
Com raras excepções, os textos das «correspondências», em finais da década de 1850, vindos de regiões tão longínquas de África eram tidos como verídicos. Estes atacavam Sá da Bandeira, acusando-o de utópico e de sentimentalista o que o teria levado a legislar sem ter em conta o estado selvagem dos povos africanos. De um modo geral havia fortes sectores ligados ao mercantilismo ultramarino. António José Seixas, antigo negreiro confesso, estabelece-se com grande fortuna em Lisboa, por volta de 1850, e é tido nas décadas seguintes como o maior perito português em questões coloniais. É ele que toca a rebate contra os que tomavam um «interesse burlesco pela liberdade do preto selvagem»; a «escola» devia ser combatida com todas as forças» exigindo-se leis tendentes a «punirem os vícios (…) característicos nos pretos nossos súbditos de Angola.
Acerca dos «vícios» e dos «pretos», havia também uma corrente de autores que, recorrentemente, se referia a perversidade inata, provavelmente irremediável, da raça negra e naturalmente propensa a selvajaria e à barbárie. No jornal do Comércio de 17 de Abril de 1858, escrevia-se sobre o «povo» negro: «que se pode esperar dum povo ignorante, vicioso, vadio, e dividido? Para verdadeiramente o caracterizar é necessário colocá-lo no último degrau da escala social (…). Preguiçoso por índole e por influência climatérica, dado a embriaguez e à sensualidade, supersticioso, estúpido, vagabundo, sem crenças nem religião é um povo desgraçado.
O tema trabalho como meio de formação do «homem civilizado» tinha já uma longa tradição no século XIX. No entanto, tal teoria ou argumentação manipuladora - em defesa da escravatura e do trabalho forçado - em meados de oitocentos era largamente aceite. Aqui a ideologia liga-se de tal forma aos interesses materiais que se torna transparente. A sua manipulação pretendia ir ainda mais longe a pretexto do decreto de 1856 que abolia o serviço de carregadores. Tinha em vista impor um regime que consagrasse a inferioridade legal da população negra, separando-a em definitivo do corpo da nação, contra as «utopias» integracionistas de Sá da Bandeira.
Tal ideologia teve larga difusão na imprensa portuguesa e nas elites da época bem dos políticos, independetemente da matiz partidária. Por exemplo, Rodrigues Sampaio, na «Revolução de Setembro», tomava como «verdadeiro axioma» que a raça negra deixada à sua liberdade não trabalha; fazia crítica acerba dos «estadistas filantropos», pedindo para África «leis apropriadas às suas circunstâncias»

segunda-feira, 22 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

VIII
Crise Angola e debate sobre o império
A crise de Angola provoca um debate generalizado sobre a situação do império em que se colocam duas concepções de fundo sobre o lugar das colónias portuguesas: A concepção de Sá da Bandeira, implícita em toda a sua actividade e explicitada no fundamental em vários documentos oficiais e depois no livro O Trabalho Rural Africano e a Administração Colonial (1873), que tinha os territórios ultramarinos como parte integrante do todo nacional e os seus habitantes como cidadãos portugueses, gozando por isso de todos os direitos e garantias estatuídas na Carta Constitucional de 1826. Com base nos seus artigos 7º e 145º (respectivamente Cidadãos Portugueses e a Inviolabilidade dos Direitos Civis e Políticos), repetidamente invocados se justificava tanto a abolição do tráfico de escravos e a própria escravatura como a extinção do serviço de «carregadores». Em presença de tais disposições constitucionais, concluía Sá da Bandeira ser positivo que os habitantes portugueses das províncias da África, da Ásia e da Oceânia, sem diferença de raça, de cor ou de religião, tivessem direitos iguais àqueles de que gozam os portugueses da Europa (1873). Os fundamentos desta concepção e o seu apoio constitucional conduziriam, no limite, a aplicação no ultramar das instituições políticas europeias, ou seja: a representação em Cortes por deputados eleitos, o regime municipal, tribunais com júris populares, imprensa livre. Esta forma de assimilação pura, aparentemente defendida por Sá da Bandeira era recusada sobretudo por não se ter em conta as diferenças culturais entre povos e raças, nivelando-se tudo em nome de uma teoria abstracta e uniformizadora. Só que, tais diferenças não eram apagadas por Sá da Bandeira, antes, pelo contrário, pressupunha-as, dando como adquirido a superioridade da civilização europeia, tomada como única e ideia vulgarizada no século XIX. Porém, esse atraso africano era atribuído, não a qualquer qualidade intrínseca da raça negra, a uma inferioridade inata e irremediável, mas a condições históricas acidentais, sendo por isso superável. A prova de que as «raças africanas» seriam «susceptíveis de receberem a civilização europeia» estaria precisamente nas colónias portuguesas, onde tinham existido e existiam ainda «pessoas de cores, tão civilizadas como os brancos que nelas habita. Por outro lado, Portugal, possuidor de «vastos territórios» em África, durante séculos, explorados da maneira mais infausta e opressiva (…), teria o dever moral de procurar difundir os benefícios da civilização europeia entre os povos que os habitam. Benefícios chamados pelos direitos inscritos na Carta. Mas, dela não decorriam a imediata extensão ao ultramar das instituições políticas. Na perspectiva de Sá da Bandeira, a tutela a exercer só seria possível pela aplicação de legislação especial que restringisse os direitos políticos dos «indígenas», de modo a evitar «as paixões e o antagonismo de raças» e a preservar o domínio português. O regime não se compatibilizava com o sistema da Carta Constitucional que distinguia entre cidadãos activos e passivos – a esmagadora maioria da população «indígena», que gozaria de direitos civis mas não de direitos políticos. A talhe de foice, se dirá também dos portugueses europeus que fossem “criados de servir” ou “cidadãos que não tivessem um renda líquida anual de cem mil réis, por bens de raiz, indústria, comércio ou empregos”, estavam excluídos de votar nos termos do artigo 65º da Carta.

domingo, 21 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

VII

O império e a imprensa portuguesa

O tratamento do tema imperial na imprensa portuguesa, durante o período da Regeneração, era assegurado, em primeiro lugar pelas chamadas «correspondências», provenientes das colónias, geralmente da autoria de altos funcionários ou de oficiais da marinha e do exército, em comissão, que escreviam também artigos relacionados com o Ultramar. Frequentemente, o debate generalizava-se, envolvendo nomes sonantes do jornalismo e da política nacionais, sempre que se debatia pontos de vista ideológicos ou interesses de ordem económica. Aconteceu, por exemplo, em 1854-1855, aquando da discussão da proposta para a entrega de Moçambique a uma companhia, já referido; depois o grave conflito diplomático que surgiu com a França em 1857. Este conflito foi originado pelo apresamento em águas territoriais moçambicanas da barca Charles et George, a 29 de Novembro de 1857, sob a acusação de fazer tráfico de escravos para a ilha de Reunião. Houve a condenação pelo tribunal local e o navio mandado para Lisboa com o seu comandante sob prisão; mas o governo francês exigiu a sua libertação imediata bem como o pagamento de uma indemnização e a devolução embarcação, argumentado que: no momento da sua captura ela transportava não escravos mas “trabalhadores contratados” com autorização das autoridades portuguesas. Era uma defesa ou contestação disfarçada do comércio negreiro, a condução de «contratados» para a citada Ilha da Reunião, que contara com a anuência do governador Carvalho e Meneses, contrariando as ordens da metrópole, tendo sido substituído em Setembro de 1857 por J. Tavares de Almeida que deu início a execução, apanhando a barca de surpresa.
Passividade da Grã-Bretanha e humilhação
Perante a passividade da Grã-Bretanha, o governo de Lisboa, que inicialmente resistira às exigências francesas, acabou por ceder a todas elas, provocando o seu desfecho um sentimento de pesada humilhação nacional.
Do ponto de vista colonial, a crise da barca Charles et George contribuiu para o enfraquecimento das posições de Sá da Bandeira com o fundamento na ausência da estrita observância do tratado britânico de 1842 e na cooperação com a Grã-Bretanha. Face a sucedido, não faltaram vozes a exigir abertamente o seu abandono de forma a permitir a livre exportação de mão-de-obra da Angola para São Tomé, até aquele momento bastante condicionada. Também já nesta altura a política de Sá da Bandeira era atacada noutros planos: era-lhe, particularmente assacado a desorganização do comércio interno de Angola, na linha de Luanda a Cassanje, em consequência da abolição do serviço forçado de «carregadores». As acusações sobem de grau em 1860 com as notícias que foram chegadas a Lisboa sobre a dificuldade das tropas portuguesas instaladas em Ambriz e no Congo; do incidente militar que resultara a morte do capitão Militão de Gusmão, perto de São Salvador; a derrota do próprio governador no Quicembo (perto de Ambriz); do desastre de uma coluna ao passar o rio Loje e também a Sul, a «guerra do Nano» na vertente do planalto oeste da serra da Chela.
Os rumores e boatos vários, trazidos de Angola pelas «correspondências», por vezes conscientes, criam um alarme geral. Dá-se Luanda como cercada por um «gentio imenso» (Jornal do Comércio de 02-05-1860) e mesmo dividida pelos «pretos insurgentes» (Jornal do Porto de 04-06-1860) e os portugueses que restavam disputando «palmo a palmo», o terreno português às imensas coortes de pretos selvagens sequiosos do roubo e do sangue português. Seguem-se os apelos patrióticos à desforra e à salvaguarda do domínio imperial. Era assim o tom da imprensa do momento: «o governo não deve cruzar os braços em presença dos desaires, que ali se acha sofrendo o bom nome português; medidas o mais que prontas e enérgicas devem ser adoptadas para conservar o que ali nos pertence, para salvaguardar os nossos irmãos que ali se vêm constantemente ameaçados, e impor aos negros o devido respeito para com as nossas autoridades (O Português de 03-05-1860).
À pressa, foi organizada uma expedição militar, sob o comando simbólico do infante D. Luís, cujos contingentes partiram para Angola em Junho de 1860.

sábado, 20 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

VI

Escassez de meios. Propostas de soluções

Face a este dilema, procurava-se como solução (havia vários defensores), a formação de companhias dotadas de poderes majestáticos. Esta era, por exemplo, a ideia defendida pelo Jornal da Associação Industrial Portuense, argumentando que seria impossível ao governo «distribuir para as colónias simultaneamente os parcos recursos de que por ora dispõe». Mas eram grandes as resistências à entrega da administração de qualquer colónia a uma companhia, resistências, de resto expressas na consulta do Conselho Ultramarino de 2 de Outubro de 1853 sobre uma proposta de constituição de uma empresa desse tipo em Moçambique (aliás, no final da década, com António Enes, serão formadas as Companhias do Niassa, Moçambique e Zambézia). A outra questão era os capitais privados. Dificilmente havia quem se dispusesse a investir no campo colonial por considerar de alto risco, sem garantias e privilégios exorbitantes. Acrescia ainda (citando Valentim Alexandre, obra que venho acompanhando) a muito generalizada relutância em investir em acções - «causa fatal do nosso atraso», segundo opinava um texto da Associação Comercial de Lisboa. A União Mercantil, constituída em 1858 e fortemente impulsionada e subsidiada pelo governo, entra em crise financeira dois anos depois. Para isso, terá contribuído a má qualidade dos navios usados e comprados por preços excessivos. A esse propósito, eis o relato de um artigo de Andrade Corvo publicado em 1861, no Jornal do Comércio sobre a União Mercantil, que a analisou em vários artigos: «o influxo nefasto que pesa sobre as nossas coisas», não por simples infelicidade, mas «por efeito do pouco conhecimento de negócios, de pouca grandeza de alma, e de excessiva cobiça de ganhar depressa e muito, empregando pouco capital e fazendo poucos esforços de vontade e de inteligência», que se faziam sentir tanto entre os estadistas como na maioria dos industriais.
Num quadro destes e no plano imperial, aponta-se a Sá da Bandeira certo cariz voluntarista. No campo político, a expressão dos mitos do «Eldorado» e da «herança sagrada», que terão marcado as elites portuguesas. Estas, no plano geral (com raras excepções), apoiavam a reconstituição do império em África. Já as políticas em concreto avançadas por Sá da Bandeira suscitavam forte oposição, muito em particular no que dizia respeito à abolição da escravatura e do trabalho forçado.
No plano imperial, também é tido como voluntarista na sua relação com a situação vivida nas próprias colónias em que se contrapunha as forças dominantes, incluindo o próprio aparelho do Estado, como já acontecera nos finais dos anos trinta. O encerramento efectivo do mercado brasileiro à importação de mão-de-obra escrava, desde 1851, alteraria significativamente o quadro económico das possessões portuguesas em África, abrindo um maior espaço de manobra à política defendida por Sá da Bandeira. No entanto, o comércio negreiro subsistia, ainda com números mais reduzidos, tendo agora Cuba como principal destino, continuando a absorver energias e capitais; as velhas estruturas mantinham-se e resistiam às orientações do poder central, não poucas vezes, com a cumplicidade dos próprios governadores: Em Moçambique, a legislação e as ordens vindas de Lisboa foram simplesmente ignoradas durante quase toda a década de cinquenta, enquanto em Angola o governador Coelho do Amaral se opunha tenazmente ao decreto de abolição do trabalho forçado dos «carregadores».

sexta-feira, 19 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

V
Sá da Bandeira e os seus planos
Os planos de Sá da Bandeira previam ainda um reforço do poder da metrópole nos territórios colónias. No campo económico esse reforço passava pelo estabelecimento de relações mercantis entre o reino e o ultramar. Depois da tentativa frustrada de formação de uma «Companhia Real Portuguesa», para a navegação a vapor, à qual haviam sido reservadas em 1856 as carreiras para os Açores e para as possessões de África Ocidental, acabaram por ser estas concedidas, dois anos mais tarde, em regime de exclusividade, à «Companhia União Mercantil». Esta Companhia agregava capitalistas das praças de Londres e de Lisboa, por exemplo, Fortunato Chamiço Jr. e o antigo negreiro Francisco António Flores. Segundo o contrato, a Companhia obrigava-se a «estabelecer a navegação regular por meio de barcos a vapor entre Lisboa e os portos de Benguela, Luanda, Moçâmedes e Ambriz, fazendo escala por Cabo Verde e São Tomé», sendo para o efeito subsidiada com 58 contos anuais (decreto de 6-5-1858).
No campo político, são retomadas as medidas de reforma do aparelho de Estado colonial delineadas desde os anos trinta. Em Angola, é suscitada de novo a formação da Junta Geral do Distrito, encarregada de dar parecer sobre todos os assuntos relevantes para a vida da província (portaria 29-09-1856) e procurando dar vida à administração municipal (portaria 10-01-1857). Iniciativas políticas que revelavam a vontade de cercear o poder dos comandantes dos «distritos» e «presídios» (antigos capitães-mores), vistos como um dos maiores obstáculos às aplicações de directrizes de Lisboa.
Finalmente, Sá da Bandeira, havia criado em 1852 um «fundo especial de colonização» cujo produto dos direitos cobrados na exportação para o ultramar, de vinhos e aguardentes (superior a 1%, em relação aos valores de 1849), visando contribuir para a irradiação dos valores europeus junto da população branca. No mesmo sentido, valorizava-se também a acção da Igreja, cuja extinção de congregações religiosas em 1834 pelos liberais adquirira um valor simbólico. Todavia, quer a formação de clero «indígena», que é mandado estabelecer em Luanda (portaria expansão territorial por carta de lei de 12 de Agosto de 1856, quer por missionários saídos do Colégio das Missões Ultramarinas (criados por carta de lei de 12 de Agosto de 1856) são apoiados.
Não se pode assim negar a Sá da Bandeira todo o plano que tentou pôr em prática quer no domínio de expansão do território, quer na transformação das estruturas sociais, fomento económico, colonização, quer ainda na modernização do aparelho de Estado Ultramarino, em toda a década de cinquenta. Só que todos os seus objectivos exigiam vastos recursos. Portugal abrangia diversos territórios no continente africano e também no Oriente. Escasseavam os próprios meios humanos. África era tida como zona de degredo, sendo geralmente difícil ou inútil ao Governo de Lisboa tentar encontrar quadros – um engenheiro ou oficiais – dispostos a cumprirem uma missão no Ultramar; os simples colonos eram raros, não excediam nos anos de cinquenta (1850), as poucas dezenas. Por outro lado, os meios financeiros eram parcos, tendo em conta a situação que o Estado vivia depois da desagregação do império luso-brasileiro em plena crise financeira, aprofundada pela guerra civil de 1834. Em termos económicos, a construção em simultâneo do Estado-Nação e o novo sistema colonial revelara-se uma tarefa bastante difícil para não dizer impossível.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

IV

Abolição da escravatura. Resistências…

Pela mesma altura, várias disposições legais abolem a escravatura em diversas parcelas do império, embora de âmbito bem limitado. Na Ilha de cabo-verdiana de São Vicente (portaria de 10-03-1855); no recém-formado distrito de Ambriz, Cabinda e Molembo (carta de lei de 23-12-1856). Em 29 de Abril de 1858, o visconde Sá da Bandeira (ministro da Marinha e do Ultramar desde Junho de 1856), fez publicar um decreto que marcava o prazo de vinte anos para abolição geral da escravatura no ultramar português. Com explicava o preâmbulo do diploma, presumia-se que passadas duas décadas, já o número de escravos seria diminuto, sendo então possível indemnizar os «legítimos senhores» dos que ainda existissem. Paralelamente, o visconde empenhou-se em levar por diante outro objectivo que lhe era caro: a extinção do serviço forçado de «carregadores» em Angola, por ele próprio já ordenada em portaria nunca cumprida datada de Janeiro de 1839. Neste ponto insiste de novo o Conselho Ultramarino de 10 de Dezembro de 1851 e novamente em 12 de Setembro de 1854. Desta vez, o governo negou-se a legislar no sentido indicado pelo Conselho, decidindo antes solicitar o parecer das autoridades angolanas (portaria de 11-1-1855). Esta posição política foi objecto de longas e violentas controvérsias nos anos seguintes entre Sá da Bandeira e o Governador de Angola, Coelho do Amaral, fortemente contrário à medida. Perante tais resistências, o Conselho optou por uma solução de compromisso, propondo (consulta de 6-07-1855), não já a extinção do serviço forçado, mas a sua regulamentação, que permitiria eliminar os seus aspectos mais chocantes, nomeadamente ao estatuir a obrigatoriedade de pagamento do trabalho prestado. Ao assumir a pasta da Marinha e Ultramar, em Junho do ano seguinte, Sá da Bandeira retomou a sua ideia, proibindo terminantemente o denominado «serviço de carregadores» ou qualquer outro serviço forçado no território de Angola, por incompatível com a Carta Constitucional, nos termos do decreto de 3 de Novembro de 1856 (que todavia autorizava a requisição de trabalhadores para a construção de estradas, por um máximo de doze dias anuais). Na mesma data, um outro diploma impunha o aumento imposto (dízimo) nas regiões onde até então se recrutavam os carregadores. O alcance das medidas estabelecidas nos dois diplomas tinha um significado político para Sá da Bandeira: eliminar as formas de coerção directa próprias do antigo regime colonial, possibilitando a integração da população, até então inseridas nas estruturas tradicionais, no mercado de trabalho e, de forma mais geral, na economia monetária, através da imposição do tributo (imposto), a exemplo do que fazia a Inglaterra nas suas colónias. Pressupunha-se que, dispondo de si próprios, os trabalhadores se dirigiriam naturalmente para as actividades mais produtivas, capazes de pagar melhores salários, beneficiando desta forma a agricultura, permitindo o desejado fomento da plantação em Angola.
Quanto à questão dos transportes no interior do território, necessitaria de uma solução modernizante, com a construção de estradas, conjugada com o aproveitamento das vias fluviais, especialmente no eixo que ia de Luanda a Cassange. Fazem-se os primeiros contactos para promover a construção de caminhos-de-ferro do tipo «americano» em Angola, autorizando-se a constituição de uma companhia para o efeito (decreto de 28-8-1857).

terça-feira, 16 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

III
Transformações estruturais, económicas e sociais
Para Sá da Bandeira, a construção do novo Império em África passava pelas profundas transformações estruturais, económicas e sociais herdadas do antigo regime colonial. Isto significava, em primeiro lugar, a extinção efectiva do tráfico de escravos, qualificado como «causa permanente da ruína das colónias em África», que dificultava o desenvolvimento da agricultura e do seu comércio lícito, afectando de igual modo «a honra e o interesse nacional» (consulta de 14-07-1854). No início da década, havia já uma alteração importante em relação a exportação de mão-de-obra negra com o fecho do mercado do Brasil, reduzindo os fluxos anuais de escravos transportados para as Américas, a partir das colónias portuguesas, de várias dezenas de milhar para cerca de 5 000, tendo Cuba como destino principal. O comércio negreiro suscitava reclamações da Grã-Bretanha. Face a esta situação, a recomendação do Conselho Ultramarino (traduzida na publicação de dois decretos de 13-12-1854 e 27-09-1856), vão no sentido do aperfeiçoamento de mecanismos interno conducentes a repressão dos negreiros e das autoridades com eles coniventes; e também do cumprimento do tratado britânico de 1842, evitando assim qualquer controvérsia com o governo londrino sobre este assunto. Era também uma forma de desarmar a oposição dos ingleses aos propósitos expansionistas de Portugal na zona do Baixo Congo. Esta proibição aplicava-se também ao transporte de negros de Moçambique para as ilhas francesas do Índico bem como nas restrições postas ao embarque de escravos de Angola para São Tomé e Príncipe onde a economia de plantação começava no seu arranque. Tal política, pretendia ir ainda mais longe no campo das transformações sociais, atacando não só o tráfico mas a própria escravatura. O primeiro passo nesse sentido é o decreto publicado a 9 de Dezembro de 1854, na sequência da consulta do Conselho Ultramarino, no qual, para além de se ordenar o registo de todos os escravos existentes nos territórios ultramarinos, cabendo ao estado o papel de «patrono natural dos escravos, dos libertos e de seus filhos», exercido em cada colónia por uma «Junta Protectora», e de se regular as formas de manumissão (libertação de escravos) e de alforria, após a publicação do decreto, ficasse «considerado na condição de liberto, com a obrigação, porém, de servir o senhor por tempo de dez anos». Esta disposição regulamentar tendia fechar sobre si o universo dos escravos de cada colónia, eliminando a fonte principal do seu recrutamento, por compra no interior do continente africano. Restava a reprodução natural como forma de reconstituição do mundo escravagista, porta que Sá da Bandeira tentou fechar através de um projecto de lei que previa a aplicação ao ultramar dos alvarás de 19 de Setembro de 1761 e de 16 de Janeiro de 1773, que davam a liberdade aos escravos entrados em Portugal bem como aos filhos de mulher escrava nascidos depois de promulgada a lei. O projecto ficou pendente e no ano seguinte as Cortes aprovaram um diploma que ia nesse sentido, determinando directamente que os filhos de mulher escrava, de futuro nascidos nas províncias ultramarinas seriam «considerados de condição livre» (carta de lei de 24-7-1856).

segunda-feira, 15 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

II
No caso de Angola, os planos visavam a expansão para norte, pela ocupação da foz do Congo e litoral limítrofe; era uma antiga aspiração que vinha desde o século XVIII e que agora renascia no novo contexto, quando o comércio dos chamados «portos do norte» ganhava maior expressão em detrimento da praça de Luanda. As pressões das autoridades angolanas iam no sentido de se tomar o porto mais próximo que era o de Ambriz. Este projecto era contrariado, de certo modo, pela instabilidade política de Portugal e sobretudo a oposição da Grã-Bretanha que não via com bons olhos a expansão em África pelo Estado português, caracterizado no domínio colonial pelas suas práticas mercantis restritivas e pela sua incapacidade em reprimir o tráfico negreiro. Sob o impulso do Conselho Ultramarino, Ambriz virá de facto a ser tomado em 1855, sem aviso prévio ao governo de Londres, então envolvido na Guerra da Crimeia. A ocupação de Ambriz visava enquadrar-se num plano mais geral que pretendia colocar sob o domínio da Coroa portuguesa todo o Baixo Congo, até Cabinda e Molembo.
Projecto de expansão
Mas o projecto de expansão territorial em Angola estendia-se ainda a sul, procurando fundar feitorias em Porto do Pinda, foz do Cunene e Angra Fria, tentando evitar assim qualquer intromissão externa. No interior, contava-se formar uma colónia europeia no Huíla, organizada militarmente, como centro de onde se dominariam o país dos Gambos, o vale do Cunene e os sertões adjacentes. Por fim, pretendia-se de imediato ganhar influência nas regiões do Libolo e da Quissama. A longo prazo, tinha como objectivo fazer a ocupação de todos os territórios que ficavam entre os pontos já controlados ou a controlar no interior, como por exemplo Bié e Bailundo.

domingo, 14 de junho de 2009

NAÇÃO E IMPÉRIO

I
O ano de 1851 marca o início de uma nova fase política em Portugal com a recomposição das forças partidárias após o golpe de Estado que derrubou o cabralismo.
Em 23 de Setembro de 1851 é criado o Conselho Ultramarino que é um órgão composto por vogais com «prática das coisas do Ultramar» ou com provada capacidade em Administração e Jurisprudência», mas sempre com a exigência de que nele tivessem assento membros conhecedores dos territórios portugueses do Ultramar. Este Órgão era de consulta obrigatória, isto é, todas as «propostas de lei acerca das Colónias» que o governo apresentasse ao Parlamento ou decretasse nos termos permitidos pelo artigo 15º do Acto Adicional de 1852, tinham de ser precedidas, obrigatoriamente, de Parecer do Conselho Ultramarino. O Conselho tinha também outras competências como propor as providências que julgasse necessárias a bem das «possessões» e de «coordenar um sistema de colonização nos lugares para isso mais apropriado», de indicar a forma mais eficaz de dirigir para as Colónias portuguesas a emigração de Portugal. O Conselho viria ainda a «exercitar também atribuições legislativas», uma vez aprovada pelas Cortes a necessária autorização. Estas competências nunca chegaram a concretizar-se.
A criação deste Conselho – já se ouvia falar na sua refundação, uma vez que o existia o Corpo com o mesmo nome, desde o século XVII, que fora extinto pelo liberalismo em 1833 – deve a Sá da Bandeira, em proposta apresentada ao Senado em 1839 e 1840. A ideia só acabaria por vingar após o golpe de Estado regenerador, em 1851. O Conselho teve também o apoio de Fontes Pereira de Melo que se iniciava nas lides ministeriais com a pasta da Marinha. Sá da Bandeira, ou Visconde Sá da Bandeira, título criado por decreto de 01-12-1834, da Rainha D. Maria II de Portugal, em benefício de Bernardo de Sá Nogueira de Figueiredo, militar durante as Guerras Liberais (nas quais perdeu o braço direito no Alto da Bandeira, em 1832, durante o Cerco do Porto) ou ainda Marquês (1854), foi o Presidente do Conselho Ultramarino.

A concepção Imperial de Sá da Bandeira passava pela consolidação da soberania portuguesa em África. Retomam-se alguns objectivos anteriores mas agora firmada com maior consistência. Transformando os pequenos enclaves no litoral (até aí reduzidos a simples pontos terminais das rotas do comércio vindas do interior do continente, cujo controlo era em grande parte deixado aos povos nativos), em territórios compactos.
Em Moçambique - o Conselho Ultramarino (C.U.) que recusara a formulação de uma proposta em moldes da Companhia Inglesa das Índias – retomam-se alguns dos objectivos anteriormente definidos: Ocupação de portos, na verdade independentes e onde se fazia o comércio dos pangaios, a começar por Angoche, o mais importante de entre eles; concentração da tropa europeia em Tete, onde se deveria formar uma colónia agrícola, em parte por distribuição de terras aos soldados no fim do seu tempo de serviço – este era um modelo de colonização militar, caro a Sá da Bandeira; e controlo apertado dos pontos extremos do litoral, norte e a sul da possessão, a fim de evitar qualquer penetração estrangeira, designadamente a da Grã-Bretanha na baía de Lourenço Marques. A presença de Livingstone na Zambézia e a migração em massa dos bóeres na zona do Cabo para norte, da qual resultou a fundação das repúblicas de Orange (1842) e do Transval (1853), foram seguidas com grande atenção. As actividades do explorador britânico Livingstone, em território moçambicano, originaram instruções específicas de Sá da Bandeira, então ministro da Marinha e do Ultramar, em 1857 e 1858, visando assegurar o domínio português sobre o curso do Zambeze, desde a foz até ao Zumbo; para controlar o comércio nas suas margens e embocadura principal (Luabo) foi instalado uma alfândega.
Quanto aos bóeres, e por iniciativa destes, os primeiros contactos vinham desde a década de quarenta, através de emissários enviados a Lourenço Marques. Em 1851, entre o porto do Transval e a baia de Lourenço Marques, desenvolvia-se com os «Holandeses bóeres» grande actividade mercantil, sendo o segundo porto. A primeira era Quelimane. Em Lisboa, via-se com o maior interesse a situação e as relações que C.U. previa com o Transval que iriam transformar Lourenço Marques num ponto comercial muito importante.

Fotos: D. Maria II, D. PedroV e Marquês Sá da Bandeira
Fonte: Valentim Alexandre, in História Expansão Portuguesa, Circulo de Leitores, Vol. 4

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A Ideia Colonial. Período de 1890-1930.

Natureza económica do Imperialismo e crise financeira
A questão, muitas vezes suscitada, se o Imperialismo que emerge do virar do século XIX será essencialmente económico, tem gerado alguma polémica na historiografia sobre o Terceiro Império. Uma posição mais eclética aponta no sentido de conjugar a natureza económica com os interesses de ordem política, ideológica e estratégica. A burguesia portuguesa à época manifestava interesses divergentes e permanecia num mercantilismo arcaico e passadista. Em suma, não existia um modelo liberal ou de capitalismo moderno nos territórios africanos sob a dominação portuguesa que correspondesse aos interesses económicos e a uma política ou ideologia e estratégia convergentes. Havia o gosto pela evasão, sede de aventura, curiosidade científica, motivações filantrópicas mergulhadas num imaginário colectivo impregnado de histórias do Ultramar, de navegadores, de descobertas, de Brasil e de recordações da «idade de ouro».
A grave crise económica e financeira e o desequilíbrio na balança de pagamentos da transferência dos emigrantes do Brasil, depois da revolução de Novembro de 1889, as dificuldades com Baring Brothers de Londres, colocaram o País a beira da bancarrota no verão de 1892. Entre a crise do ultimatum e a implantação da República, o mercado colonial externo português representava 4% das importações e 15% das exportações em 1910. Nesta data, apenas 20 000 brancos de origem portuguesa residem em Angola e Moçambique. Entre 1890 e 1910, a emigração portuguesa que emigrava regularmente para o Brasil variava entre 10 000 a 20 000 pessoas anuais. O ano de 1885 atingiu o número máximo de 25 000 partidas.
É neste contexto de crise financeira, comercial e demográfica, que António Enes, comissário régio, em Moçambique, desenvolve um novo modelo económico no virar do século XIX, cita-se: «O grande segredo de Enes é combinar a pauta proteccionista de 1892 com um tratamento de privilégio ao capital estrangeiro, que passa a beneficiar de situações de excepção. Desta forma, são concedida a administração e exploração a três companhias privadas de capitais estrangeiros (essencialmente britânicos, franceses e alemães): a Companhia do Niassa (que controla ao norte cerca de 200 000 km2), a Companhia de Moçambique (140 000 km2 do território, ao centro) e a Companhia do Zambézia (100 000 km2 ao Centro). Estas companhias, verdadeiramente majestáticas vão ser dotadas de poderes consideráveis e irão conhecer a sua «idade de ouro». O monopólio do comércio e de exploração mineira, o direito de fixar e de cobrar impostos, de cunhar moeda e de organizar as suas próprias forças armadas; uma ampla autonomia legislativa e aduaneira com poderes exorbitantes concedidos por um período de cinquenta anos. Em troca, o Estado português recebia 7,5% dos lucros e 10% dos dividendos distribuídos.
Modelo semelhante foi concebido para Angola, mas com um papel menos importante. Em Angola desenvolveu-se e vitalizou-se o comércio local centrado na borracha e no café (em crise a partir de 1900), cuja concorrência era menos activa entre as potências europeias nestas regiões. A Companhia de Moçâmedes foi criada em 1984 a partir de capitais franceses.
Com as campanhas de pacificação (Moçambique 1894-1898 e Angola 1901-1907), e a respeito das concessões feitas às companhias majestáticas, a ocupação efectiva das terras e o controlo exercido pelas autoridades portuguesas sobre as economias locais tendem a desenvolver-se. Esta extensão é acompanhada pela generalização do trabalho forçado, desde 1890, através de uma legislação que obriga o indígena ao pagamento de um imposto pessoal e «à obrigação legal de trabalhar». Antes da 1ª Guerra Mundial, o trabalho forçado foi objecto de duras críticas internacionais. Por exemplo, o caso da produção de cacau em S. Tomé (terceiro produtor mundial), foi objecto de um inquérito, tornado público em 1907. O inquérito e a referência a exploração dos trabalhadores de Angola e a sua importação, alimentou uma violenta campanha internacional contra o império português.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

A Ideia Colonial. Período de 1890-1930

Em Angola, nomes como Paiva Couceiro, que foi Governador-Geral (1907-1909), João Almeida, Artur de Paiva, Roçadas; ou ainda na Guiné à volta dos nomes de Soveral Martins e de Teixeira Pinto.
A maior parte destes oficiais formados nesta escola conservará um sentimento nostálgico do seu passado colonial pelo seu papel pioneiro, temerário, e por ter contribuído para o bom nome de um exército rotineiro reduzido às tarefas no continente. Após a instauração da República, muitos irão engrossar as fileiras das formações nacionalistas de extrema-direita ou afirmarem no campo monárquico. Alguns ainda farão uma brilhante carreira, como um dos futuros instigadores do golpe de Estado de 28 de Maio de 1926, o general Gomes da Costa, um decano da campanha de Mouzinho.
Com a morte de António Enes (1901) e Mouzinho (1902) «teóricos do terreno», foi preciso esperar pelo General Norton de Matos, decano das campanhas de Moçambique, tendo permanecendo prolongadamente em Goa (1898-1908). Ele é a encarnação do modelo oficial capaz de enriquecer a consciência colonial dos seus concidadãos; contribuíra para quebrar a imagem do conquistador, antes a do fundador, construtor e administrador do império.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

A Ideia Colonial. Período de 1890-1930.

Redescobrir os descobrimentos.

A situação em Moçambique traduzia a precariedade da presença portuguesa e as graves dificuldades financeiras que a monarquia atravessava. O retardamento nas campanhas de pacificação e de ocupação efectiva. Moçambique, segundo alguns, constituía um fardo que devia ser cedido a melhor oferta. António Enes, comissário real em Moçambique (1891-1892 e depois 1894-1895) logo que lá chega a situação evolui e rejeita proposta de venda. Entende que os desatinos da administração de Moçambique correspondem aos da Metrópole: «Tendo-nos governado mal no reino, não podíamos ter-nos governado bem no Ultramar». No segundo mandato, António Enes coordena as operações militares de pacificação no sul do país contra Gungunhana, chefe dos Vátuas; Rodeado dos jovens oficiais Paiva Couceiro, Mouzinho de Albuquerque, Freire de Andrade, Caldas Xavier, Aires Ornelas. É a gesta dos novos conquistadores.
António Enes reabilita a situação e prova a Europa a força material e moral para reprimir a sublevação dos indígenas. A campanha de 1885 termina com a captura do chefe dos Vátuas em Chaimite. Mouzinho de Albuquerque, oficial de Cavalaria e sucessor de António Enes no cargo de comissário real, é um dos heróis mais celebrado.
As campanhas de pacificação em Angola e Moçambique constituem a «epopeia moderna dos descobrimentos» à semelhança do exemplo seguido em relação ao “Sábio de Sagres – Infante D. Henrique “; fez escola e teve seguidores que se inspiraram nos seus métodos.
Apesar das inimizades pessoais entre António Enes e Mouzinho de Albuquerque ( ambos heróis coloniais junto da opinião pública) contribuíram bastante para o desenvolvimento de Moçambique. Eram ambos organizados, dotados de improvisação na acção e temerários; não recuaram perante a insuficiência de meios humanos e materiais, conseguindo adoptar as melhores tácticas de combate. António Enes concentrou-se nas descargas, formação em quadrado, disciplina férrea, combates breves, economia de munições e de homens, formação de colunas móveis e apoio logístico de uma marinha ligeira. A estes princípios de base militar, Mouzinho de Albuquerque acrescenta o entusiasmo das suas célebres cargas de cavalaria

terça-feira, 2 de junho de 2009

A ideia Colonial

A Conferência de Berlim estabeleceu um novo direito público colonial, formulado na Acta Geral assinado em 26 de Fevereiro de 1885. A efectivação da soberania nominal passou, assim, a ser a ocupação efectiva, sem a qual, corríamos o risco de ver denunciada a nossa aliança tradicional com a Grã-Bretanha. A consequência da Conferência de Berlim foi a partilha da bacia do Congo, descoberta por Portugal em 1482, em esferas de influência belga e francesas.
Em 1886 Portugal assina um Tratado com a França e Alemanha. Sem se tomarem as devidas precauções começaram-se a pagar tributos aos «protectores» da expansão portuguesa. O preço pago a Alemanha incluía concessões substanciais de territórios entre Angola e o Sudoeste Africano Alemão.

Julgando-se Portugal assim garantido contra a Grã-Bretanha, o Governo Português apresentou às Cortes o plano para a criação de um domínio africano que iria da costa de Angola à de Moçambique, ocupando territórios que passaram a figurar no chamado «mapa côr-de-rosa».

O projecto português contrariava o plano britânico de fazer atravessar a África, no sentido vertical, do Cairo ao Cabo, o que pressupunha a ocupação de territórios que figuravam no mapa de cor vermelha. A Inglaterra protestou contra a atitude portuguesa dizendo que tanto a Niassalândia como a Matabalândia estavam já sob soberania britânica. Portugal ainda envia em 1889 uma expedição a Moçambique, comandada por Serpa Pinto, a fim de proceder a sua junção e à ocupação efectiva que figurava no mapa cor-de-rosa, mas o protesto inglês tomou forma de ultimato. A Alemanha e a França limitaram-se a observar.
A regra estabelecida na Conferência de Berlim só considerava abrangida pela soberania colonial os países que tivessem a ocupação efectiva das terras. Este argumento jurídico não convinha a Portugal e por isso o contestava face aos seus “direitos históricos – imprescritíveis”.
Portugal refugia-se assim no seu passado glorioso e quando outras potências descobrem África, Portugal redescobre os descobrimentos.
Portugal foi o primeiro país a passar o Cabo Bojador e a conhecer a costa africana no século XV e dos primeiros e únicos colonizadores de África há mais de quatro séculos. Da realidade à ficção – descobrir não é colonizar -, esboça-se o mito de «um império de cinco séculos».
É o tempo dos novos conquistadores. Portugal, enfraquecido também por uma grave crise económica e financeira, necessita de redescobrir os seus descobrimentos e ocupar efectivamente o interior das terras que lhe falta assegurar o controlo administrativo e económico. Tentativa de consolidar as posições portuguesas em Angola e Moçambique. As fronteiras então traçadas e fixadas no Tratado britânico de 1891 não significavam que a soberania nos territórios de Angola e Moçambique estivesse assegurada. Daí a prioridade na política de ocupação efectiva das terras.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

A Ideia Colonial

Período de 1890-1930.
As minhas consultas sobre a temática colonial pretende analisar o nosso antigo domínio imperial numa visão que vá além do colonizador português e compará-la a outras potências estrangeiras e se possível na perspectiva do «Outro». São os nossos historiadores que no-la indicam, partindo de uma realidade mitificada para o mito da singularidade. Os factos políticos, económicos e religiosos relacionados com a sua redescoberta. Esta, está associada ao ultimatum de 1889. Fundamentalmente, pretende-se responder a interrogação sobre a própria singularidade de um eventual «modelo colonial português». Os modos de exploração, administração e de valorização das colónias; se houve um modo diferente de «estar no mundo».
É costume, apontar-se o ultimatum britânico de 11 de Janeiro de 1890 como uma data-charneira (uma espécie de um antes e um depois…) como surgimento da ideia Colonial. É o período que vai do traumatismo do ultimatum até ao Acto Colonial. Assim a visão do historiador Yes Léonard. Antes daquela data, havia em Portugal defensores que achavam que os domínios coloniais não rentáveis deviam ser vendidos por constituírem um fardo para a economia nacional. Depois do ultimatum, os territórios ultramarinos passaram a ter carácter vital e a ser uma esperança para a nação portuguesa, logo inalienáveis. Estabeleceu-se uma ligação entre o tema nacionalista, muito popular num país de capitalismo dependente como o nosso e as colónias africanas – depois da humilhação do ultimatum – passaram a ser um meio compensatório a subordinação portuguesa no sistema de relações internacionais.