VI
Escassez de meios. Propostas de soluções
Face a este dilema, procurava-se como solução (havia vários defensores), a formação de companhias dotadas de poderes majestáticos. Esta era, por exemplo, a ideia defendida pelo Jornal da Associação Industrial Portuense, argumentando que seria impossível ao governo «distribuir para as colónias simultaneamente os parcos recursos de que por ora dispõe». Mas eram grandes as resistências à entrega da administração de qualquer colónia a uma companhia, resistências, de resto expressas na consulta do Conselho Ultramarino de 2 de Outubro de 1853 sobre uma proposta de constituição de uma empresa desse tipo em Moçambique (aliás, no final da década, com António Enes, serão formadas as Companhias do Niassa, Moçambique e Zambézia). A outra questão era os capitais privados. Dificilmente havia quem se dispusesse a investir no campo colonial por considerar de alto risco, sem garantias e privilégios exorbitantes. Acrescia ainda (citando Valentim Alexandre, obra que venho acompanhando) a muito generalizada relutância em investir em acções - «causa fatal do nosso atraso», segundo opinava um texto da Associação Comercial de Lisboa. A União Mercantil, constituída em 1858 e fortemente impulsionada e subsidiada pelo governo, entra em crise financeira dois anos depois. Para isso, terá contribuído a má qualidade dos navios usados e comprados por preços excessivos. A esse propósito, eis o relato de um artigo de Andrade Corvo publicado em 1861, no Jornal do Comércio sobre a União Mercantil, que a analisou em vários artigos: «o influxo nefasto que pesa sobre as nossas coisas», não por simples infelicidade, mas «por efeito do pouco conhecimento de negócios, de pouca grandeza de alma, e de excessiva cobiça de ganhar depressa e muito, empregando pouco capital e fazendo poucos esforços de vontade e de inteligência», que se faziam sentir tanto entre os estadistas como na maioria dos industriais.
Num quadro destes e no plano imperial, aponta-se a Sá da Bandeira certo cariz voluntarista. No campo político, a expressão dos mitos do «Eldorado» e da «herança sagrada», que terão marcado as elites portuguesas. Estas, no plano geral (com raras excepções), apoiavam a reconstituição do império em África. Já as políticas em concreto avançadas por Sá da Bandeira suscitavam forte oposição, muito em particular no que dizia respeito à abolição da escravatura e do trabalho forçado.
No plano imperial, também é tido como voluntarista na sua relação com a situação vivida nas próprias colónias em que se contrapunha as forças dominantes, incluindo o próprio aparelho do Estado, como já acontecera nos finais dos anos trinta. O encerramento efectivo do mercado brasileiro à importação de mão-de-obra escrava, desde 1851, alteraria significativamente o quadro económico das possessões portuguesas em África, abrindo um maior espaço de manobra à política defendida por Sá da Bandeira. No entanto, o comércio negreiro subsistia, ainda com números mais reduzidos, tendo agora Cuba como principal destino, continuando a absorver energias e capitais; as velhas estruturas mantinham-se e resistiam às orientações do poder central, não poucas vezes, com a cumplicidade dos próprios governadores: Em Moçambique, a legislação e as ordens vindas de Lisboa foram simplesmente ignoradas durante quase toda a década de cinquenta, enquanto em Angola o governador Coelho do Amaral se opunha tenazmente ao decreto de abolição do trabalho forçado dos «carregadores».
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