sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

Operações a Leste de Luanda -II

Permanecemos uma semana ou mais aquartelados junto das instalações militares. Dormíamos numa tenda de acampamento militar enorme, onde instalamos as macas (colchões de dormir), de um e de outro lado da entrada da porta, deixando livre um corredor ao meio para a nossa passagem. Aqui constatamos mais em pormenor as dificuldades e as diferenças entre nós fuzileiros e os camaradas do exército. No dia em que chegamos ao quartel não havia vinho para ser servido às refeições o que provocou um mal-estar da nossa parte... Suponho que compramos cerveja, que era na verdade a nossa bebida habitual e preferida. Segundo relato dos soldados, os barris de vinho que chegavam ao aquartelamento, quinzenalmente ou mensalmente, eram logo bebidos nos dois ou três dias imediatos. O resto do tempo ficavam a pão e água, como se costuma dizer, e não estava longe da verdade. Nesses dois ou três dias eram bebedeiras constantes; pelo menos divertiam-se um pouco naquele fim do mundo. A comida era intragável. Muitas vezes valia-nos o recurso às latas de conservas que lá conseguíamos comprar. O pão era cozido diariamente no quartel e sabia-nos bem comer pão fresco. De facto, a nossa postura era mesmo diferente da deles. A sua disciplina, ao mesmo tempo indisciplinada e sem sentido, hierarquicamente subserviente, confrangia-nos: o meu capitão, o nosso sargento ou cabo..., não combinava nada com a nossa forma militar de actuar e proceder. A esse propósito, num dia em que já estávamos todos deitados e a conversar uns com os outros, entrou um soldado pela nossa tenda dentro – assustado – para nos vir alertar que estávamos a fazer barulho, dizendo: se o nosso capitão sabe... O Lucas (Muxagata), não foi de modas. Interrompeu-o logo e disse-lhe: Oh pá; nosso? - Só se é vosso. Nós cá não temos capitães. Vai-te embora! – O soldado deu meia volta e lá se foi... Claro que também respeitávamos os graduados e as patentes, mas numa postura diferente, vertical. O tratamento era o de senhor: do Marinheiro ao Almirante. Outros factos sucederam-se e um deles até serviu para o nosso camarada Armindo Machado (16 528) ficar todo envaidecido com a proeza. Certa ocasião, um elemento do exército veio pedir ajuda para fechar o taipal da camioneta onde se guardava os botes pneumáticos. Tinha mandado lá três soldados mas estes não o conseguiram fechar. O sargento Chamusca (Ferreira) ouviu e respondeu logo: eu tenho um homem na minha secção que faz isso sozinho! Chamou o Armindo Machado (Lumumba ou vinte e oito) e este prontamente resolveu o assunto. Era um camarada corpulento, com muita força, que adorava conduzir os botes nas patrulhas – ir ao motor. Em troca, carregava sozinho com os depósitos de combustível. O Machado, assim que chegou ao local, deu um encosto ao taipal da camioneta e correu os fechos, na maior, para espanto dos soldados presentes! Só que daqui em diante, o nosso admirado companheiro achou-se muito importante e meteu-se em trabalhos... Teve uma participação e ameaça de prisão, com a vinda, inclusive, de uma avioneta de Luanda para o vir buscar. Provavelmente para lhe instaurarem um processo disciplinar. Acontece que o presumível instrutor, oficial, juntamente com os elementos da esquadra de que fazia parte o Machado, foram fazer um reconhecimento de bote pelo rio. Tal como já havia acontecido na operação do dia 22 de Setembro, o bote ficou imobilizado num banco de areia. Uma vez mais, o Machado demonstrou a sua capacidade física. Pegou no bote e transportou-o às costas. Os acompanhantes que não o conheciam ficaram espantados com tal façanha. À sua conta o Machado ficou com o problema disciplinar resolvido. Foi-lhe recomendado juízo para de futuro e assunto ficou arrumado. Para falar verdade, quem conhecia este camarada sabia bem que ele era um bonacheirão. A força hercúlea que possuía era proporcional à sua pacificidade..
Imagens:
1 e 2. As refeições e refeitórios em Massau;
3,4 e 5 .Camarada Armindo Machado/16528 (falecido)

Notas à margem do Livro (9)


Operações a leste de Luanda. O assassinato de um pescador


Esta é uma história triste que não foi pormenorizada no livro mas que é importante fazê-lo agora, por consideração ao nosso camarada Zé Alves que - não tendo sido o seu autor - a viveu e foi afectado por ela. Aqui fica o seu relato:

Alvarinho, já contei isto muitas vezes porque consta do meu auto de averiguações, que é uma das façanhas em teatro de guerra que me deixaram grandes marcas e que sonho com elas. Que foi o seguinte: quando saímos integrados num pelotão do Exército, em botes nossos, andavam pescadores à pesca em pirogas, e ao se tentar apanhá-los eles fugiram para a água e andamos ali uns tempos até que se apanhou um. Depois desembarcamos: eu, com uma secção, e um alferes com um pelotão; e os botes regressaram ao acampamento. Assim que começamos a desembarcar, um magala subiu a rampa com um pescador (que apenas tinha uma tanga) e com a faca de mato, ia empurrando-o e golpeando-o… perguntou então ao Alferes se podia ir para trás de uns arbustos conversar com o preto… e o alferes apenas encolheu os ombros! Passado alguns segundos, apareceu por detrás dos arbustos com as tripas na mão, dizendo: Oh meu Alferes, olhe para isto? Este já está!... Prosseguimos a marcha por meio de arbustos e armadilhas, e passado poucos minutos começaram a gritar da outra margem, vamos fazer queixa na UPA. Mataram o N... pescador indefeso, e continuavam a berrar, até que um dos magalas, sem autorização, disparou uma rajada na direcção de onde vinham os lamentos, e imediatamente responderam com tiro certeiro junto de nós: foi então quando eu disse para o Alferes se não pusesse ordem na situação, eu e os meus homens tomaríamos outro rumo. Foi então quando deixamos a zona e caminhamos na direcção do acampamento. O dito magala assassino, ainda vangloriou-se quando fomos comer a ração de combate, e ousou comer com a faca de mato com que tinha matado o pescador. O dito magala parece que era da Alfama.
Isto nunca foi visto (o auto de averiguações) em consideração pelo Frei Picadas (Imediato Paiva Boléo)
O que eu sei é que vejo este filme bastantes vezes.

Um bem-haja amigo

abração do Zé

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65


Operações a Leste de Luanda

Esta foi uma operação conjunta com o exército, no leste de Angola. Decorreria ainda o ano de 1964. Fomos transportados em camionetas «GMC ou Unimogs» que nos conduziram até ao destino. Passámos por vilas e cidades como Négage (desvio), Carmona, onde pernoitamos, Quitexe, Sanza Pombo até Massau, aonde estava aquartelado a Companhia do Exército, junto dos rios Cuando-Cubango.
Durante o percurso, ainda demorado, recordo-me da imagem florestal. Árvores que nos acompanhavam e se entrelaçavam ao centro da via de um lado ao outro e dos macacos e saguins que saltitavam entre troncos e ramagens. Avistavam-se grandes plantações de café e de abacaxis ou ananases. Em determinado momento, o Sinais e o Póvoa descerem das viaturas - quando estas subiam vagarosamente a serra - foram apanhar ananases e começaram a lançá-los para dentro das camionetas para o pessoal comer. Lembro-me de ver as placas de sinalização rodoviária cravejadas de balas.

Imagens:
1. Transportes Viaturas GMC
2. Arlindo Ramos, Pão-Mole e José Francisco ao fundo
3.e.4. Descarregamento de material margem do Rio Cuando-Cubando em Massau


No dia 22 de Setembro de 1964, preparou-se a operação para reconhecimento do Cubango. A minha esquadra, formada pelo Romão (Quatrocentos) e o José Ricardo (16403), não pôde seguir para o rio porque havia um problema no bote: creio que um furo e não se podia esperar mais tempo para repará-lo. Eu fazia dezanove anos nesse dia, razão por que me lembro com precisão da data. Tive pena de não prosseguirmos na operação e de termos ficado em terra. Mas, há males que vêm por bem... Os nossos camaradas foram mesmo atacados com vários disparos do outro lado. Tratava-se de uma zona que não conhecíamos. O rio Cubango era muito diferente do Zaire. Havia muitas zonas baixas e assoreadas, bancos de areia, que paralisavam o andamento dos botes. Valeu na ocasião a intervenção da força aérea. Foi, aquilo que se costuma dizer, um dia em cheio! – Nesta operação, foi morto um pescador em terra, de forma bárbara, por um soldado do exército, provavelmente em tentativa de fuga.










5. Carmona
6. Négage 7. Aspecto de Sanza Pombo





















































Fragata D.Fernando II e Glória

Comissão Fragata D. Fernando II e Glória



Recebi do nosso camarada José Alves um e-mail onde manisfesta o orgulho por ter sido aluno da Fragata D. Fernando II e Glória e apela a restauração da Comissão que "ficou pelo caminho", conforme diz no texto abaixo descrito:




Ter orgulho de ter sido aluno da Fragata, apelo para que vingue a comissão que ficou pelo caminho. Deixo aqui o alerta.

O 182 de 1955, "O GORILA"

Barreiro, 25/01/2009

José Moreira Alves

e-mail:
zalves@netvisao.pt


Segue historial da Fragata D. Fernando II e Glória:

A Fragata "D.Fernando II e Glória", o último grande navio à vela da Marinha Portuguesa e também a última "Nau" a fazer a chamada "Carreira da Índia" – verdadeira linha militar regular que, desde o século XVI e durante mais de 3 séculos, fez a ligação entre Portugal e aquela antiga colónia – foi o último grande navio que os estaleiros do antigo Arsenal Real de Marinha de Damão construíram para a nossa Marinha.
A Fragata recebeu o nome de "D.Fernando II e Glória", não só em homenagem a D.Fernando Saxe Coburgo Gota, marido da Rainha D.Maria II, mas também por ter sido entregue à protecção de Nossa Senhora da Glória, de especial devoção entre os goeses.
O navio embora construído pelos planos duma fragata de 50 peças, foi de início preparado para receber 60 bocas de fogo, tendo em 1863 / 65 sido transformado para receber só 50, 22 no convés e 28 na bateria. A lotação do navio variava consoante a missão a desempenhar, indo do mínimo de 145 homens na viagem inaugural ao máximo de 379 numa viagem de representação.
A Fragata tinha boas qualidades náuticas e de habitabilidade, designadamente no que se refere a desafogo das instalações, aspecto este de suma importância numa época em que ainda se faziam viagens, sem escala, de 3 meses, com 650 pessoas a bordo, incluindo passageiros.
A viagem inaugural, de Goa para Lisboa, teve lugar em 1845, com largada em 2 de Fevereiro e chegada ao Tejo, em 4 de Julho. Desde então, foi utilizada em missões de vários tipos até Setembro de 1865, data em que substituiu a Nau Vasco da Gama, como Escola de Artilharia, tendo ainda, em 1878, efectuado uma viagem de instrução de Guarda-Marinhas aos Açores, que foi a sua última missão no mar, onde teve a oportunidade de salvar a tripulação da barca americana "Laurence Boston" que se incendiara.
Durante os 33 anos em que navegou, percorrendo cerca de 100 mil milhas, correspondentes a quase 5 voltas ao Mundo, a "D.Fernando", como era conhecida, provou ser um navio resistente e de grande utilidade, tendo efectuado numerosas viagens à Índia, a Moçambique e a Angola para levar àqueles antigos territórios portugueses unidades militares do Exército e da Marinha ou colonos e degredados, estes últimos normalmente acompanhados de familiares. Chegou até a levar emigrados políticos espanhóis para os Açores.
De entre as missões que lhe foram confiadas, destacam-se a participação como navio-chefe de uma força naval na ocupação de Ambriz, em Angola, que em 1855 se revoltara por instigação da Inglaterra, e, ainda, a colaboração na colonização de Huíla em que, como navio de guerra, teve a insólita e curiosa missão de transportar ovelhas, cavalos e éguas do Cabo da Boa Esperança para Moçamedes (Angola), numa real missão de serviço público. Colaborou, ainda, com o grande sertanejo António Silva Porto, transportando, em 1855, os seus 13 pombeiros da ilha de Moçambique para Benguela, depois destes terem completado a travessia de África, de Benguela à costa de Moçambique.
Em 1889 sofreu profundas alterações para melhor servir como Escola de Artilharia Naval, substituindo-se a antiga e airosa mastreação por três deselegantes mastros inteiriços, com vergas de sinais e construindo-se dois redutos a cada bordo para colocação de peças de artilharia modernas, para instrução, utilização que cessou em 1938.
Em 1940, não estando já em condições de ser utilizada pela Marinha, iniciou uma nova fase da sua vida, passando a servir como sede da "Obra Social da Fragata D.Fernando", criada para recolher rapazes oriundos de famílias de fracos recursos económicos, que ali recebiam instrução escolar e treino de marinharia, até que, em 1963, um violento incêndio a destruiu em grande parte.


Comissão Fragata D.Fernando © 1996,8 Realização: Jorge Pinto e Tiago Andrade e Silva



quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65


Cabinda - Massabi
Uma das diligências que fazia parte do circuito operacional dos fuzileiros especiais era o Posto de Massabi. Ao chegarmos ao Posto, em 28 de Maio de 1964, tivemos a triste notícia que cinco militares do exército tinham sido mortos pelos guerrilheiros da FNLA, provavelmente numa emboscada.
No Posto de Massabi tínhamos como vizinho um sujeito da PIDE que habitava numa moradia amurada. Com ele vivia uma moça indígena muito bonita, bonita mesmo. Tinha feições perfeitas, um corpo esculturalmente bem feito, olhos negros lindos, cabelos escuros, acho que escorreitos, enfim, uma deusa! Só que com menos vinte anos que o seu consorte de ocasião, cuja idade devia rondar os quarenta. Morria de ciúmes por ela e não era para menos... Não a deixava expor-se ao pessoal, não fosse o diabo tecê-las!... Olhávamos para ele com aquela desconfiança que nos merecia todo o indivíduo que pertencia à polícia secreta. Tínhamos, no nosso espírito, um horror aos bufos. Além disso, constava-se que este fora queixar-se de uns soldados ao capitão do exército porque aqueles lhe tinham furtado uns cocos ou laranjas lá da propriedade.

Posto de Massabi e o macaco Benfica.
Na foto seguinte, o Lucas passeando o macaco frente a casa do PIDE .
Nunca ninguém percebeu bem qual a sua relação entre a actividade policial e a gestão agrária, mas isso é outra política. O que se segue é que o Capitão não foi de modas e castigou mesmo os soldados. Este episódio não agradou nada ao pessoal que ficou de pé atrás...No entanto e por estratégia, supõe-se, o indivíduo até se aproximava de nós fuzileiros, jogava a bola connosco, mostrava-se afável e chegou mesmo a oferecer-nos garrafas de uísque em ocasiões festivas. Junto da moradia do dito cujo havia um laranjal que era vigiado toda a noite para não lhe roubarem as laranjas. Pois bem, era o próprio vigia, a nosso pedido, que ia apanhar as laranjas e no-las trazia para comermos! Em frente da própria moradia e do nosso Posto avistava-se um Barracão, tipo Fábrica, com uma maquinaria antiga que se dizia pertencer ao empório da CUF.

O Júlio e o macaco e o macaco junto da fábrica da CUF (parcial)
A imensa riqueza natural, mineira e florestal da região gerava e ainda geram a cobiça de muitos empresários e políticos. Uns desses recursos naturais eram os Palmeirais, de onde se extraía, a partir da recolha dos frutos de dendém pelos palmadores, o respectivo óleo de palma. Era com recurso às maquinetas obsoletas da fábrica e à mão-de-obra indígena, mal paga, que se arrecadava o produto.
Havia ainda o vinho de palma que era feito artesanalmente e tinha o nome de malavo. É extraído da seiva da flor da palmeira, muito apreciado e consumido pela população negra. Nós também chegámos a beber esse líquido que era delicioso!

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

LUANDA. Férias e castigo.
Levantamento de rancho.

Ao fim de alguns meses de mato e vigilância nos Postos do Zaire, a Secção Eco foi de férias para Luanda. Estávamos no mês de Novembro de 1963. O Presidente dos Estados Unidos John Kennedy é assassinado a 22 de Novembro e o Estado Português decretou o luto, durante três dias, com a bandeira portuguesa a meia-haste.






Cortejo em Dallas, Estado de Texas a 22 Novembro 1963 e o Funeral (família).
Seriam umas férias repartidas por secções. O Destacamento não podia ir todo de licença ao mesmo tempo, penso que era essa a ideia. Até aqui tudo bem. Já dava para curtir a Baia e Ilha de Luanda, não obstante haver escala de serviço e outras diligências... Mas a cidade, as praias e a actividade nocturna eram francamente compensadoras. O pior foi quando se fez um levantamento de rancho. - Por esta é que ninguém esperava!... A refeição do almoço nem seria assim tão má: Mão-de-vaca com grão. Havia até camaradas que gostavam muito “deste prato” mas por espírito de camaradagem ninguém comeu. Havia uma razão de fundo que já não me lembro bem, mas que se relacionava com a forma como as refeições eram geridas pelo cabo de rancho. Os subsídios atribuídos à alimentação eram reforçados e podia haver refeições melhoradas. A fruta era quase sempre banana e os pratos eram confeccionados em razão dos baixos custos... A verdade é que a nossa atitude não terá agradado ao próprio responsável pela gestão das refeições que se foi queixar ao comando.
O oficial superior, de alta patente, deslocou-se ao refeitório, provou a comida e disse que estava boa. Depois voltou-se para nós e perguntou: não comem? - Não comem, porquê? – Todos ficamos calados. Ninguém respondeu. Chamou-nos crianças e depois alguém nos mandou formar. O nosso receio, na altura, foi que o «comando» mandasse armar alguém hierarquicamente acima de nós para nos intimidar a comer... Ainda bem que isso não sucedeu (não terá passado de uma ameaça…) porque então já tínhamos planeado acorrermos todos à caserna e pegar nas nossas armas também...
Face ao sucedido mandaram-nos para o mato: Norte de Luanda. Passámos por Ambriz e Ambrizete e fomos parar a um Quartel de Cavalaria. Aqui fomos bem recebidos por um capitão do exército que mandou preparar uma boa refeição para nós. Depois da refeição, o capitão veio perguntar-nos se tínhamos gostado. O Diogo respondeu e disse que estava uma porcaria! E devia estar... Só que eles ofereceram o melhor que tinham e para nós era o pior...

Ambrizete – Instalações militares (fonte /Ivo Cardoso)

A nossa ocupação era fazer umas rondas junto ao mar, até a costa. Aqui o nosso camarada Júlio Santos adoeceu e sentiu-se muito mal... O Romão diz que nesta semana ou pouco mais que passamos nesta zona é que foram uma óptimas férias!

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

Capítulo IV

Eventos, acontecimentos e operações militares


VISITA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA A SAZAIRE



– Almirante Américo Thomaz –


Outubro de 1963.


Foi graças ao envio destas fotos pelo Fernando Caseira (Póvoa) que referencio a visita do então Presidente da República, Almirante Américo Thomaz a Angola. A visita terá ocorrido em Outubro de 1963 e por essa ocasião foi o nosso camarada José Neto condecorado: em 7 de Outubro.




Chegada do Presidente da República ao Zaire.














P.R. acompanhado à direita por Pinheiro de Azevedo e Pascoal Rodrigues









Escolta ao PR. Jeeps fuzileiros




domingo, 25 de janeiro de 2009

Notas à margem do Memorando (8)

Dom Miguel Corno Pacaça…
Esta nota à margem do Memorando teve como finalidade juntar uma foto de do Dom Miguel Roto, Corno Pacaça (marinheiro auxiliar negro), citado no Livro, a propósito de uma história contada pelo Agostinho Maduro mas que não me lembro: nem da história nem do Miguel Corno Pacaça.. O José Alves, também ficou espantado de eu não me lembrar dele, e enviou-me o seguinte e-mail: Camarada Dionísio, não te lembras do Miguel Pacaça? Era ele que içava e arriava a bandeira na Defesa Marítima. Já confessei que não. Mas fui procurar nas fotos em grupo uma fotografia em que estava um militar negro a içar ou arriar a bandeira junto à Defesa Marítima do Zaire. Recortei-a, também juntamente com uma outra em que eu o próprio estava numa formatura ao lado do Miguel aquando da visita do Senhor Presidente da República, Almirante América Tomás, a Santo António do Zaire em 1963. Sãs essas imagens que interessante partilhar convosco.
Nem o Alves nem o Agostinho garantem cem por cento que o camarada negro que está fotos (e ao meu lado direito) seja o Miguel Corno Pacaça mas quase…
Nota importante: Qual a situação dos antigos soldados e marinheiros africanos?
Já tinha terminado este escrito quando recebi notícias do Agostinho Maduro a dar-me conta que em Luanda havia muitos marinheiros auxiliares negros, citando-me mais um nome: o do Domingos Correia. Era um marinheiro de quem os fuzos gostavam muito não só por ser doido por cerveja nocal (a minha marca preferida), como por alinhar com a malta… A história destes militares africanos, à época ao serviço das forças armadas portuguesas, deu-me que pensar! – O que foi feito deles? Sobretudo os sobreviventes! Recebem alguma pensão de reforma, em igualdade de condições com os militares portugueses? Na verdade, aqueles militares que ainda não faleceram terão já atingido o limite de idade para a reforma, desde que tenham prestado 5 anos de serviço, de acordo com a lei portuguesa. Desconheço, é certo, se houve alguma negociação oficial ou Convenção a respeito, mas algo me diz que não. No entanto, parece-me justo que o Estado Português reconhecesse esse direito. Não tanto do ponto de vista legal ou até de moral - que também é - mas sobretudo por uma questão de justiça! Haverá com certeza dados ou registos nos Ministérios e Departamentos respectivos e por intermédio das Embaixadas se faça um levantamento dos antigos militares africanos sobrevivos, e, oficiosamente, se desenvolva todo o processo junto da Caixa Geral de Aposentações.

Notas à margem do Memorando (7)

Patuscadas...
Ainda sobre o episódio das patuscadas, o Alves e o Agostinho vieram a dizer algo mais sobre o assunto.
O Alves por ter revelado algo que eu não sabia ou não me lembro o que vem a dar no mesmo: O falecido Miranda cozinhava muito bem; até pensou ser cozinheiro antes de ir para fuzileiro!
O Agostinho descreve assim este tema:
Gostei de ver as reportagens das caçadas e petiscadas.
Só que há mais. Não foram assim tão poucos os almoços de peixe que tivemos, especialmente, no posto do Tridente. Havia três maneiras de conseguirmos o peixe:

A primeira era a compra directa. Lembro-me bem de um peixe que comprámos a um nativo no posto da Quissanga. Pesava uns 30 a 40 kg e pescador que o matou não o conseguiu pôr dentro da piroga: teve que o rebocar até ao posto para nos vender.
Uma outra maneira de obtermos peixe era com granadas. No ancoradouro do Posto do Tridente despejávamos os restos de comida para a água e esperávamos alguns minutos… depois lançávamos uma granada ao rio! Até parece que estou a ver o pessoal no bote e o Galvão dentro da água a tirar o peixe para dentro do bote. Com este método, arranjávamos refeição para umas trinta pessoas.
A terceira forma era a pesca a linha. Certa altura, quando estivemos em Luanda, o Firmino Valério (16
108) comprou umas linhas de pesca e alguns anzóis, mas não disse nada a ninguém... Quando chegou ao Posto do Tridente aparelhou 5 ou 6 linhas, amarrou-as ao cais, iscou os anzóis com carne e lançou-os ao rio. A partir de então criou-se um vício entre a malta: ir ver se a linha tinha peixe… Digo-vos: - não foram assim tão poucas as refeições que fizemos! Tudo isso graças ao camarada amigo Valério - já falecido - que descanse em paz.
O rio Zaire é muito rico em peixe e o camarão era apanhado por nós ( juntávamo-nos dois e ou três) com uma rede de mosqueteiro velho, nas pequenas muílas! Outras vezes, recorria-se a um novo método inventado pelo Valério para arrebanhar peixe e que consistia no seguinte: fazer uma vala na areia e colocar nela um balde com restos de comida, e esperar que o peixe (miúdo) lá fosse parar e retirar o balde… Isto acontecia no Posto da Quissanga onde se fazia boas patuscadas. Bons tempos!
Fotos: As duas primeiras são do Miranda e a terceira do Valério ( falecidos).
Posto do Tridente e o Posto da Quissanga ( à direita: Póvoa, Galvão e Vininha Cardoso ao meio)

sábado, 24 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

José Francisco e o tronco milagreiro
Numa ocasião, em que o José Francisco ia sozinho no bote, larga o manípulo do motor e pôs-se a urinar! O bote atira-o ao rio (...) e ele vai parar ao Congo em cima de um tronco de árvore à deriva! Quando o foram resgatar já ia quase no Posto da Quissanga... O tronco foi levado para a Macala e o José Francisco pintou-o de vermelho e verde, prestando deste modo uma homenagem e fidelidade à bandeira portuguesa. O autor da proeza, posteriormente a este relato, precisou alguns pormenores interessantes. Então, a história contada por ele começa assim:

No dia de São Martinho, dia 11/11/64, estando eu de serviço a torre de vigia do Posto do Tridente, no rio Zaire de Angola, o marinheiro 14 850, Faias, pediu-me para os ir levar de bote ao pé dos farol dos diamantes ou seja às bóias de sinalização existentes no canal de navegação do rio Zaire.
Saindo eu de serviço por volta das cinco da manhã já eles estavam (
o Faia e supõe-se os outros elementos da esquadra) a minha espera e assim iniciamos o transporte do posto até às proximidades do Farol onde eles desembarcaram porque o regresso era a pé. Eu voltei só com o bote. A meio do percurso, por circunstâncias de haver alguns redemoinhos no rio, o bote deu uma guinada e eu caí a água. Como estava vestido de fato de macaco, tive que me libertar de tudo: desabotoar o cinturão onde estava o sabre, as cartucheiras com os carregadores e respectivas munições; desatar as botas e desapertar o fato de macaco, tudo de seguida... Mas cada vez que tirava uma coisa ia ao fundo...Quando terminei estava muito cansado! – Valeu-me um molho de papiros que vinha pelo rio abaixo. Só que quando passava por outro redemoinho ficava sem nada... Foi então que apareceu o dito pau milagreiro, que eu apanhei e nunca mais o larguei, e assim estou vivo e de boa saúde.
O pior –
prossegue o José Francisco – : foi não haver autorização para andar só um elemento no bote; por isso foi-me dito: “ ou pagas o material todo ou és castigado”. Como eu estava a espera de ser promovido a marinheiro tive que optar por pagar o material e assim, no fim do mês, me descontaram tudo. Sei que as munições foram pagas a 12$50 cada uma, as outras coisas, não sei!
Este acontecimento foi notícia na rádio e teve as suas consequências como nos descreve o nosso camarada:... Foi noticiado às 7 horas da noite pela rádio Brazzaville que tinha caído um fuzileiro ao rio e por estas horas já deveria estar no fundo do rio. Eu estava a ouvir o noticiário e revoltado: trabalho dobrado, mais patrulhas, maior vigilância e patrulhas de reconhecimento pelos arredores do Posto porque eles estavam a controlar os nossos movimentos.

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

Evolução de Gafanhoto para Picadas.
O camarada Alves lembrou-se da designação de Gafanhoto, atribuída ao Imediato Paiva Boléo, e da sua passagem para o Picadas. Esta alcunha surgiu porque o Imediato «Boléo» fazia o pessoal caminhar léguas de capim, mais alto do que ele, e abrir picadas e passagens por todos os sítios: desde riachos até aos trilhos mais difíceis. Aconteceu assim, numa operação levada a cabo por indicação de um branco, que afinal era um espia! – Quando fazíamos paragens para mastigar as célebres rações de combate, deparávamos com os pés em estado lastimoso. Molhados, com bolhas, comichão... Lá vinha a matacanha, espécie de pulga, que se apanhava descalço e criava um pus grosso. Os africanos tinham grande prática e arrancavam-na com o bico de um pau. O feijão-macaco, que provocava uma comichão dos diabos. E, para rematar, vinha também o pé de atleta que era um fungo que se infiltrava por entre os dedos dos pés.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 Angola 1963-65

Não te esqueças de apareceres logo
para jantar connosco...
Era um jogo de futebol entre Fuzileiros e o pessoal do exército no campo do Táritári em Sazaire. Às tantas, um soldado da equipa adversária dá uma canelada forte e feia, no Diogo. O Diogo vira-se para ele e diz-lhe: Não te esqueças de apareceres logo para jantares connosco, que por acaso é galinha no churrasco… – Para quem viveu esta época, sabe que comer galinha de churrasco era
um dos melhores manjares. O Diogo era o responsável pela gestão do rancho na Unidade de Fuzileiros e havia que preparar meia galinha para cada um dos futebolistas convidados! Claro que, a partir daquela informação, ninguém mais ousou aproximar-se das suas canelas. Porém, à conta dela apareceram mais de vinte pessoas para o jantar!





1.Bancada a assistir ao futebol em Santo António do Zaire

2. Desafio de futebol

3. Equipas alternativas: A,B,C e D






















































































































quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

O soldado do exército e a compra de aerogramas...
Esta história é um olhar à nossa volta; solidário e demonstrativo da nossa sensibilidade. Como se sabe, havia um aquartelamento em Nóqui e um Posto na Pedra do Feitiço. Era pois frequente, as lanchas que subiam o rio, transportarem também os soldados do exército. Durante o seu percurso, e conforme o destino, as lanchas


faziam curtas paragens nos Postos e nós acamaradávamos com esses militares. Conversávamos, bebíamos umas cervejas, petiscávamos, etc. Numa ocasião dessas, em que a lancha aportou na Pedra do Feitiço, um soldado do exército, com pronúncia acentuada da região de Viseu, abeirou-se do Agostinho Maduro, puxou por dinheiro e pediu-lhe que quando fosse a Xazaire lhe comprava uns aerogramas. O Agostinho disse que sim, que comprava, e depois lhe diria quanta era... Quando o Agostinho se deslocou a Sazaire, foi a Capitania e pediu alguns aerogramas ao sargento que lá estava e este disse: - Serve-te! Estão aí na tua frente. Assim foi. O nosso camarada pegou num punhado de aerogramas, trouxe consigo e entregou cerca de 500 ao soldado que lhos pedira. Quando este perguntou o preço, o Agostinho disse: isso é grátis. Não conseguiu porém esconder duas lágrimas e concluir que nós, fuzileiros, éramos uns felizardos!




Nota: fota acima são o Olegário ( à esquerda) e o Júlio Santos.


Memorando DFE4 - Angola 1963-65

As patuscadas
A caça era uma forma de actividade lúdica e simultaneamente um contributo alimentar. Quem gostava de caçar levantava-se cedo e ia por esses planaltos e serras fora à sua procura. Quase sempre trazia-se caça. Uma gazela, um javali, um burro do mato ou uma pacaça ou ainda qualquer bicharoco esquisito. Faziam-se bons bifes das peças de carne e das suas miudezas (vísceras) umas petiscadas
para o lanche, por volta das quatro ou cinco horas da tarde, que se designava por matiné. Quem não ia à caça e comia, pagava as bebidas, geralmente cerveja, ou encarregava-se de preparar o petisco. No Posto da Macala era o camarada Horácio que, de resto fazia também de cozinheiro. Era trabalhador e dedicado à causa. Por vezes, matava-se uns crocodilos ou uns répteis, geralmente jibóias, e esfolava-se com jeito para aproveitar a pele que depois de bem curtida poderia ser vendida no mercado. As carnes destes répteis, como variante à da gazela e do javali, eram cozinhadas e servidas para quem quisesse. No meio desta confusão, havia sempre alguém que comia enganado, e depois de saber vomitava, como aconteceu, certa ocasião no Posto da Macala. Aqui, segundo o relato do Alves, foi preparado um petisco de jibóia e convidado para a refeição um marinheiro fogueiro. Não queria acreditar e pensava que era galinha… quando lhe confirmaram foi para detrás da caserna vomitar! Estas cenas repetiam-se também com jacarés. Nunca comi. Depois de esfolado, tinha um cheiro activo a peixe…
Caça: Almada, António José, Piriquito, Toni, Barreiro.
Zé Luís, Cardoso, Galvão, Valério.
Caçadores: Zé Mestre, Protestante, Pacheco e António José.
Romão pega na jibóia
Caçadores de crocodilo: Zé Mestre, Almada, Mix, Alex e Raposo (?).
Zé Alves, Miranda, Francisco Ferreira...