terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Memorando DFE4 - Angola 1963-65

LUANDA. Férias e castigo.
Levantamento de rancho.

Ao fim de alguns meses de mato e vigilância nos Postos do Zaire, a Secção Eco foi de férias para Luanda. Estávamos no mês de Novembro de 1963. O Presidente dos Estados Unidos John Kennedy é assassinado a 22 de Novembro e o Estado Português decretou o luto, durante três dias, com a bandeira portuguesa a meia-haste.






Cortejo em Dallas, Estado de Texas a 22 Novembro 1963 e o Funeral (família).
Seriam umas férias repartidas por secções. O Destacamento não podia ir todo de licença ao mesmo tempo, penso que era essa a ideia. Até aqui tudo bem. Já dava para curtir a Baia e Ilha de Luanda, não obstante haver escala de serviço e outras diligências... Mas a cidade, as praias e a actividade nocturna eram francamente compensadoras. O pior foi quando se fez um levantamento de rancho. - Por esta é que ninguém esperava!... A refeição do almoço nem seria assim tão má: Mão-de-vaca com grão. Havia até camaradas que gostavam muito “deste prato” mas por espírito de camaradagem ninguém comeu. Havia uma razão de fundo que já não me lembro bem, mas que se relacionava com a forma como as refeições eram geridas pelo cabo de rancho. Os subsídios atribuídos à alimentação eram reforçados e podia haver refeições melhoradas. A fruta era quase sempre banana e os pratos eram confeccionados em razão dos baixos custos... A verdade é que a nossa atitude não terá agradado ao próprio responsável pela gestão das refeições que se foi queixar ao comando.
O oficial superior, de alta patente, deslocou-se ao refeitório, provou a comida e disse que estava boa. Depois voltou-se para nós e perguntou: não comem? - Não comem, porquê? – Todos ficamos calados. Ninguém respondeu. Chamou-nos crianças e depois alguém nos mandou formar. O nosso receio, na altura, foi que o «comando» mandasse armar alguém hierarquicamente acima de nós para nos intimidar a comer... Ainda bem que isso não sucedeu (não terá passado de uma ameaça…) porque então já tínhamos planeado acorrermos todos à caserna e pegar nas nossas armas também...
Face ao sucedido mandaram-nos para o mato: Norte de Luanda. Passámos por Ambriz e Ambrizete e fomos parar a um Quartel de Cavalaria. Aqui fomos bem recebidos por um capitão do exército que mandou preparar uma boa refeição para nós. Depois da refeição, o capitão veio perguntar-nos se tínhamos gostado. O Diogo respondeu e disse que estava uma porcaria! E devia estar... Só que eles ofereceram o melhor que tinham e para nós era o pior...

Ambrizete – Instalações militares (fonte /Ivo Cardoso)

A nossa ocupação era fazer umas rondas junto ao mar, até a costa. Aqui o nosso camarada Júlio Santos adoeceu e sentiu-se muito mal... O Romão diz que nesta semana ou pouco mais que passamos nesta zona é que foram uma óptimas férias!

5 comentários:

  1. OLÁ MALTA!
    Se por acaso tiveram só esse levantamento de rancho no quartel da Ilha de Luanda, eu estava lá também, quando de passagem para o “Puto” em férias por um mês, pagas pela Briosa! Lembro-me que nesse dia passei fominha de rachar, no entanto admirei a forma resoluta como o fizeram. Onde alguns até disseram, o que o Álvaro já disse, que recorreriam às armas, se necessário fosse! Sei que isso aconteceu semanas depois de ter morrido o Kennedy. Todavia, na ída para Moçambique estivemos no mesmo quartel talvez uma semana, penso! A praia e água, logo ao atravessar a estrada, era um espetáculo! Lembro-me que num dia, durante seis horas, só saía da água para ganhar balânço correr e mergulhar outra vez. Melhor que umas férias e à borla, que jamais esquecerei!!!
    Saudações a todos...
    Leiria

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  2. Bom dia Artur/Leiria!
    Na verdade, este mundo é mesmo cheio de surpresas! Quem diria que estiveste em Luanda naquela data? A Ilha e Baía de Luanda com aquelas praias de sonho nunca encontrei igual. Era isso mesmo: só atravessar a rua e dar balanço para um mergulho...Só para saber isso já valeu a pena o levantamento de rancho..
    Um grande abraço para ti Artur-Leiria

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  3. Caro Álvaro Dionísio, sou jornalista, estou a fazer um trabalho sobre a guerra colonial e gostaria de o contactar. O meu mail é dora.alexandre@gmail.com

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  4. Olá a todos! Eu também estava nesse levantamento de rancho.A hipótese de pegarmos nas armas surgiu quando o oficial de serviço quis prender um cabo, cujo nome não me recordo. O oficial de serviço mandou recolher os bilhetes de entidade aos que estavam preparados para sair. Foi o comandante da base que, antes de sair, foi ter com ele e lhe disse: eu, se fosse a ti, deixava-os sair. Dali a pouco tempo restituíram os BI, e parte de nós fomos comer Luanda.

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